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sábado, 26 de abril de 2008

ARTIGO DO FABIO ULHOA COELHO: TÍTULOS DE CRÉDITO ELETRÔNICOS

RECOMENDADA A LEITURA PELO PROFESSOR RUI COPPOLA

TÍTULOS DE CRÉDITO ELETRÔNICOS

Sumário
1. Os dois suportes dos documentos: papel e eletrônico
2. Princípios de Equivalência Funcional
3. Lacuna no ordenamento brasileiro
4. Conceito de títulos de crédito eletrônicos
5. Equívocos em torno do artigo 899, § 3º, do Código Civil
6. Os princípios do Direito Cambiário e os títulos de crédito eletrônicos
7. A transmutação de suporte

I. OS DOIS SUPORTES DOS DOCUMENTOS: PAPEL E ELETRÔNICO
A pedra foi provavelmente o primeiro suporte adotado para o registro e informações. As pinturas rupestres de bisões, touros, mamutes e outros animais feitas durante a Era Glacial nas paredes e tetos de cavernas em Lascaux, Sul da França, são talvez o exemplo mais remoto do registro de informações úteis tendo a pedra como suporte.
Especula-se que tais pinturas, datadas de 15000 a 10000 a.C., serviriam à introdução dos mais jovens na arte da caça, desempenhando função pedagógica de extrema importância; ou que cumpririam função diversa, de ordem quase mística, servindo para enfraquecer o animal com estocadas em sua imagem (1).
Pedagógica ou mística, qualquer que tenha sido a razão daqueles desenhos, nossos ancestrais consideraram oportuno registrar as informações de que dispunham sobre a anatomia dos animais e usaram a pedra para isso, o meio privilegiado para o registro das informações mais relevantes durante milênios.
Os signos cuneiformes do Código de Hamurabi foram esculpidos numa estela de diorito negro na rica e militarmente poderosa Babilônia do século XVII a.C. (2)
Mas quando não se justificava o custo e o trabalho associados ao registro em pedra, o homem fez uso de suporte diverso: a argila. As primeiras tabuletas de que se tem notícia são as encontradas em 1924 no Sul do que hoje é o Iraque. São os primeiros LIVROS da humanidade, feitos pelos sumérios entre 4100 a.C. e 3300 a.C. (3). O tecido vegetal substituiu a argila como suporte de informações, primeiramente na forma de papiro, usado pelos egípcios pelo menos desde 1300 a.C.; depois, como papel, inventado na China no século I e trazido à Espanha pelos árabes quase mil anos depois. Principalmente depois da invenção da imprensa, em 1450, o papel foi o meio mais empregado no registro de informações úteis pelos homens. Aliás, desde a sua difusão e até o advento do computador, cumpriu praticamente sozinho a função de suporte de informações úteis.
A partir da invenção do processamento eletrônico de dados, paulatinamente o suporte preferencial para as informações úteis tem deixado de ser o papel. Diante desse quadro, é o caso já de se assentar que, em relação ao suporte, os documentos jurídicos podem ser classificados em duas categorias: “PAPELIZADOS” ou ELETRÔNICOS. Os documentos papelizados são aqueles cujas informações são registradas e armazenadas por meio de gravação em tinta lançada numa lâmina de origem vegetal. As informações dos documentos eletrônicos, ao seu turno, são registradas e armazenadas em mídia apta a provocar num computador determinadas sensibilizações elétricas.
Nos documentos eletrônicos, as informações sobre sujeitos, objeto, local, data e os demais dados relevantes às relações jurídicas estão digitalizados, isto é, traduzidos numa seqüência binária correspondente à sensibilização ou à ausência de sensibilização elétrica; uma seqüência extraordinariamente extensa de 0 (símbolo da falta de sensibilização elétrica) e 1 (símbolo da sensibilização elétrica). Registrar uma informação em meio eletrônico significa, então, TRADUZI-LA para uma seqüência binária, uma sucessão de zeros e uns. Claro que a informação assim registrada e guardada não é inteligível diretamente ao homem. Quando tenho um contrato em papel redigido em linguagem de meu conhecimento, basta visualizá-lo (lê-lo) para captar a informação. Ninguém conseguiria, no entanto, entender o conteúdo do registro em meio eletrônico se acaso pudesse visualizá-lo, pois veria apenas sensibilizações por energia e ausência dela em vários condutores articulados, cujo significado sua mente não poderia apreender.

II. PRINCÍPIO DA EQUIVALÊNCIA FUNCIONAL
A Uncitral (Comissão das Nações Unidas para o Direito Mercantil Internacional) aprovou, em 1996, uma LEI-MODELO sobre comércio eletrônico,aperfeiçoando-a em 1998. A Assembléia Geral da ONU recomendou que os países se inspirassem nessa lei-modelo ao disciplinarem a matéria em seus direitos internos (4).
O Princípio fundamental norteador da lei-modelo da Uncitral é o da Equivalência Funcional ( ou NÃO-DISCRIMINAÇÃO) e está formulado no seu artigo 5º: “não se negarão efeitos jurídicos, validade ou executividade à informação tão-somente pelo fato de se encontrar na forma de mensagem de dados). O pressuposto factual desse Princípio é a constatação de que o meio eletrônico cumpre as mesmas funções do papel em relação ao registro de informações de relevância jurídica. A partir dela, afirma a impertinência de se negar juridicidade a um documento eletrônico apenas em razão da natureza de seu suporte.
De acordo com o GUIA para a incorporação da lei-modelo, o papel desempenha as seguintes funções relativamente ao documento jurídico que o adota por suporte: a) permite a leitura do documento por todos os interessados; b) assegura a integridade do documento ao longo do tempo; c) permite a reprodução, para que todas as partes possam ter um exemplar idêntico do escrito; d) permite a autenticação por meio da assinatura das partes; e) serve à produção de prova perante o Juiz e a Autoridade Administrativa (5). No desempenho dessas funções, o meio eletrônico oferece segurança igual (e, em alguns casos, até mesmo maior) que o papel. Não há, por isso, fundamento para se exigir em relação ao documento eletrônico o atendimento de outros requisitos de validade, eficácia e executividade além dos já exigidos para o documento papelizado. É este o ditado do PRINCÍPIO DA EQUIVALÊNCIA FUNCIONAL.
Em outros termos, tanto o suporte papel como o suporte eletrônico desempenham, em relação ao documento jurídico, as seguintes funções:
1. ACESSIBILIDADE.
As partes e, se o documento for público, todos os interessados podem ter acesso às informações registradas. No documento papelizado, como assinalado, basta que o leitor conhecedor da linguagem em que foi escrito tenha o suporte em mãos e o leia. No eletrônico, o acesso é garantido ao conhecedor da linguagem em que o documento foi escrito mediante seu processamento em computador que o traduza da seqüência binária para caracteres legíveis na tela.
2. INTEGRIDADE
Acostumados que estamos com o intenso uso do papel, depositamos nele demasiada confiança no sentido de que ele garante a integridade das informações registradas. Mas, todos sabemos, o papel pode ser adulterado. A integridade é assegurada na medida em que a adulteração deixa pistas que podem ser detectadas por perícia. Pois bem, à semelhança do papel, um arquivo eletrônico adulterado também deixa pistas detectáveis por perícia. A única diferença é que as deixadas pelo papel são físicas e as do meio eletrônico, eletrônicas.
3. REPRODUTIBILIDADE
No passado, o documento em papel podia ser copiado em outro papel (manuscrito ou datilografado), de modo a possibilitar que todas as partes tivessem seu próprio exemplar. Algumas pessoas ainda devem se lembrar do papel-carbono, usado para confeccionar o documento em duas ou mais vias. Hoje, a reprodução do papel faz-se com o emprego do meio eletrônico, como no escaneamento da petição inicial para se enviar por e-mail, na transmissão da ordem de pagamento por fax ou mesmo na extração de cópia xerográfica do contrato. O meio eletrônico possibilita, assim, maior segurança na reprodução do que a simples cópia de um papel em outro.
4. AUTENTICAÇÃO POR ASSINATURA
O documento eletrônico pode ser autenticado por assinatura digital, feita com o emprego da criptografia assimétrica, no contexto da ICP-Brasil, a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira (6). Garante-se, com essa assinatura, a autenticidade e a integridade do documento, e eventualmente sua privacidade (quando o documento é criptografado simultaneamente com a chave privada do emissor e com a pública do destinatário). Cumpre o documento eletrônico, quando observada essa técnica (ou outra que venha a ser criada com o mesmo grau de segurança), idêntica função à do papelizado. Pode-se ter certeza de que a declaração (informação) partiu de um determinado sujeito de direito e foi recebida por outro.
5. FUNÇÃO PROBATÓRIA
Os documentos eletrônicos são admitidos como prova em juízo ou perante a Autoridade Administrativa tal como os que têm o papel como suporte (7).

III. LACUNA NO ORDENAMENTO BRASILEIRO
Na lei brasileira, a única referência ao documento eletrônico se encontra no regramento da ICP-Brasil, restrita à questão da assinatura digital. Não existe nenhuma norma expressa preceituando que a validade, eficácia e executividade do documento eletrônico são idênticas à do papelizado. Apesar de tramitarem vários projetos inspirados, mais ou menos, na lei-modelo da Uncitral, ainda não dispõe a nossa ordem jurídica de nenhuma disciplina do estatuto jurídico sobre o documento eletrônico. Há, assim, uma lacuna que, nos termos do artigo 4º da Lei de Introdução do Código Civil (LICC), deve ser colmatada a partir dos Princípios Gerais do Direito. O Princípio da Equivalência Funcional pode e deve ser invocado pelos Juízes para a superação dessa lamentável lacuna, de modo a dispensar o demandante que funda sua pretensão num documento eletrônico de qualquer outra prova não imposta aos que exibem documentos papelizados.
A petição inicial de execução da duplicata eletrônica pode, assim, ser instruída com o instrumento de protesto por indicações e relatório impresso noticiando a entrega da mercadoria, oriundo este de sistema eletrônico em que está armazenada a informação e no qual conste a certificação da assinatura digital do executado ou seu preposto (8). Isto porque a nenhuma informação pode ser negada eficácia, validade e executividade só pela circunstância de ter por suporte um meio eletrônico.

IV. CONCEITO DE TÍTULOS DE CRÉDITO ELETRÔNICOS
O título de crédito eletrônico é o documento eletrônico representativo de direito autônomo ao recebimento de quantia líquida.
A nota promissória eletrônica é o documento eletrônico de que constam todos os requisitos essenciais (informações) exigidos pelos artigos 75 e 76 da Lei Uniforme de Genebra. Se o credor a endossa, lança-se o registro eletrônico das informações pertinentes a esse ato de transferência da titularidade do crédito, como nome do endossatário, data, se há ou não CLÁUSULA SEM DESPESAS ou CLÁUSULA SEM GARANTIA, etc. O saque, endosso e aval da nota promissória serão praticados mediante assinatura digital do subscritor, endossante ou avalista, certificada no mesmo arquivo eletrônico.
Os institutos do Direito Cambiário que dependem necessariamente do suporte papelizado não têm equivalente no título de crédito eletrônico. Não há como se falar, por exemplo, em ENDOSSO EM BRANCO da nota promissória eletrônica. Esse ato cambiário torna o título ao portador uma modalidade necessariamente associada ao instrumento em papel. Não há como ter a posse exclusiva do registro eletrônico no mesmo sentido com que se tem a de um pedaço de papel. Mas sempre que compatível com o suporte eletrônico, o ato cambial será igualmente admissível no título de crédito eletrônico, como no caso do AVAL EM BRANCO, por exemplo.

V. EQUÍVOCOS EM TORNO DO ARTIGO 889, § 3º, DO CÓDIGO CIVIL
O artigo 889, § 3º, do Código Civil estabelece: “O TÍTULO PODERÁ SER EMITIDO A PARTIR DOS CARACTERES CRIADOS EM COMPUTADOR OU MEIO TÉCNICO EQUIVALENTE E QUE CONSTEM DA ESCRITURAÇÃO DO EMITENTE, OBSERVADOS OS REQUISITOS MÍNIMOS PREVISTOS NESSE ARTIGO”. Alguns entendimentos têm visto nesse dispositivo a introdução no Direito Positivo Brasileiro dos títulos de crédito eletrônicos. Bem lido e entendido o parágrafo, entretanto, nota-se que ele apenas trata da emissão do título a partir de caracteres criados em computador. Ele autoriza, por exemplo, que o texto da nota promissória seja inicialmente digitado em arquivo Word e, uma vez impresso EM PAPEL e assinado de punho pelo subscritor, passe a valer como título de crédito. Com ênfase, quando a lei menciona a emissão do título de crédito A PARTIR de caracteres criados em computador, isso está longe de corresponder à admissibilidade do meio eletrônico como SUPORTE. Em outros termos, a emissão, circulação e cobrança do crédito registrados exclusivamente em meio eletrônico não encontram respaldo nesse dispositivo de lei, que cuida penas da geração do documento A PARTIR de caracteres criados em computador.
A juridicidade do título de crédito eletrônico resulta, no Brasil, por enquanto, da colmatação da lacuna existente no ordenamento jurídico nacional, feita nos termos do artigo 4º da LICC, mediante a invocação do Princípio Geral, reconhecido pelo Direito Comercial Internacional, da Equivalência Funcional.

VI. OS PRINCÍPIOS DO DIREITO CAMBIÁRIO E OS TÍTULOS DE CRÉDITO ELETRÔNICOS
São três os princípios do Direito Cambiário: CARTULARIDADE, LITERALIDADE e AUTONOMIA DAS OBRIGAÇÕES. Os primeiros estão de tal modo associados ao suporte papel, embora não no mesmo grau, que não passam incólumes pelo processo de difusão do suporte eletrônico. O único Princípio a se conservar idêntico, no descarte do suporte papel para o registro da emissão, circulação e cobrança do crédito comercial é o da Autonomia (e seus Subprincípios: Abstração e Inoponibilidade das Exceções Pessoais aos terceiros de Boa-Fé).
O PRINCÍPIO DA CARTULARIDADE, que pressupõe a posse do documento para o exercício do direito nele mencionado, não se ajusta ao ambiente eletrônico. Não há equivalente possível entre a posse física do pedaço de papel em que se lançavam as informações sobre o crédito e qualquer relação de fato do credor com os registros eletrônicos em que elas se assentam no novo suporte. O Princípio da Cartularidade se destinava a impedir a cobrança do título por quem não fosse mais o seu titular, por foca de endosso anteriormente praticado. Como o documento eletrônico sempre incorporará a informação atualizada sobre a titularidade do crédito, não há o risco de o antigo credor apresentar-se como sendo ainda o titular do direito. Em nada preocupa, assim, o fim do Princípio da Cartularidade.
Já o PRINCÍPIO DA LITERALIDADE, pelo qual não produzem efeitos cambiários os atos que não constam do teor do título de crédito, encontra equivalência no novo suporte. O QUE NÃO HÁ NO REGISTRO ELETRÔNICO, NÃO HÁ NO MUNDO – será o brocardo daqui para a frente. Quer dizer, quando tiver o título de crédito suporte eletrônico, não produzirá efeitos cambiais, por exemplo, o aval concedido num instrumento papelizado. O Princípio da Literalidade não desaparecerá, como o da Cartularidade, mas deverá ser ajustado ao suporte eletrônico.
Graças à preservação do PRINCÍPIO DA AUTONOMIA e ao ajuste do da LITERALIDADE, a cambial eletrônica continuará a cumprir a mesma função de facilitar a agilização e mobilização do crédito comercial que vinham cumprindo satisfatoriamente os títulos papelizados desde sua criação na Idade Média.

VII. A TRANSMUTAÇÃO DE SUPORTE
Na verdade, o que existe hoje em dia no Brasil como prática disseminada não é a emissão do título de crédito em meio eletrônico. Como ainda se encontra, aqui e acolá, alguma resistência em relação ao novo suporte documental e ninguém quer assumir o risco de ver desconstituído o seu direito ao crédito (ou, menos pior, não reconhecida sua executividade, liquidez e certeza), tem-se adotado a sistemática de o emitir em papel, promovendo-se em suporte eletrônico a circulação e liquidação. Verifica-se o que eu proponho chamar de TRANSMUTAÇÃO DE SUPORTE: o título de crédito papelizado torna-se eletrônico e, caso não adimplido, retorna ao antigo suporte para fins de cobrança judicial.
A transmutação do suporte – esta nova figura do Direito Cambiário, que associa ao título de crédito suportes variados ao longo do tempo – está claramente estabelecida na lei brasileira na disciplina de pelo menos dois instrumentos cambiários: a Cédula de Produto Rural (CPR) e os Títulos do Agronegócio (Warrant Agropecuário – WA, e o Conhecimento de Depósito Agropecuário – CDA).
Em relação à CPR, estabelecem o artigo 19 e seus §§ 1º e 3º, inciso I, da Lei n. 8.929/1994:
“Art. 19. A CPR poderá ser negociada nos mercados de bolsas e de balcão.
§ 1º - O registro da CPR em sistema de registro e de liquidação financeira, administrado por entidade autorizada pelo Banco Central do Brasil, é condição indispensável para a negociação referida neste artigo.
(...)
§ 3º. A CPR registrada em sistema de registro e de liquidação financeira de ativos autorizado pelo Banco Central do Brasil terá as seguintes características:
I – será cartular antes do seu registro e após a sua baixa escritural ou eletrônica enquanto permanecer registrada em sistema de registro e de liquidação financeira.”
E, no tocante aos Títulos do Agronegócio (WA e CDA), ESTIPULA O ARTIGO 15 DA Lei n. 11.076/2004 a OBRIGATORIEDADE do registro em “sistema de registro e de liquidação financeira de ativos autorizado pelo Banco Central”:

Art. 15. É obrigatório o registro do CDA e do WA em sistema de registro e de liquidação financeira de ativos autorizado pelo Banco Central do Brasil, no prazo de até 30 (trinta) dias, contado da data de emissão dos títulos, no qual constará o respectivo número de controle do título, de que trata o inciso II do caput do art. 5o desta Lei.
§ 1o O registro de CDA e WA em sistema de registro e de liquidação financeira será precedido da entrega dos títulos à custódia de instituição legalmente autorizada para esse fim, mediante endosso-mandato.
§ 2o A instituição custodiante é responsável por efetuar o endosso do CDA e do WA ao respectivo credor, quando da retirada dos títulos do sistema de registro e de liquidação financeira.”

Como se percebe nesses dispositivos, a lei previu a emissão do título de crédito necessariamente em suporte papel. O documento papelizado, contudo, pode não ser (no caso da CPR) ou não é (no dos Títulos do Agronegócio) o instrumento apropriado para a negociação e liquidação tempestiva. Ele fica guardado (custodiado) numa instituição financeira, enquanto as informações correspondentes são registradas num SISTEMA DE REGISTRO E LIQUIDAÇÃO FINANCEIRA AUTORIZADO A FUNCIONAR PELO BANCO CENTRAL (por exemplo, a Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos – Cetip). A partir daí, o suporte do título de crédito deixa de ser o documento papelizado e passa a ser exclusivamente o arquivo eletrônico correspondente. Enquanto aberto o registro, nenhum ato cambiário que venha a ser praticado no papel terá qualquer eficácia jurídica, porque o suporte do título de crédito, nesse ínterim, é apenas o eletrônico. Todos os endossos e garantias só existirão, serão válidos e eficazes se devidamente registrados no documento eletrônico que serve de suporte para o título de crédito.
A lei, até o momento, trata da transmutação do suporte apenas desses três títulos (CPR, CDA e WA), mas nada impede que ocorra com qualquer outro. a disciplina da operação será, à falta de norma legal específica, a do regulamento do sistema de registro e liquidação financeira autorizado a funcionar pelo Banco Central em que o título de crédito vier a ser admitido.
O título de crédito emitido em papel e transmutado para o meio eletrônico não costuma voltar ao suporte originário se é liquidado no vencimento. Apenas no caso de inadimplemento do devedor, por se fazer necessária a cobrança judicial, é que o registro eletrônico cessa seus efeitos e volta a existir o título exclusivamente no documento papelizado. Aquele que constar dos registros eletrônicos como o último titular do crédito vai buscar esse instrumento da custódia da instituição financeira para, com ele, instruir a ação de cobrança ou execução.
Desse modo, quando se disseminar o processo judicial eletrônico (Lei n. 11.419/2006), o suporte papel dos títulos de crédito poderá ser completamente descartado. Não haverá, então, mais necessidade da emissão em papel, sua custódia e a transmutação do suporte.







(1) E.H. Gombrich. A História da Arte, 16ª ed., tradução de Álvaro Cabral. Rio de Janeiro, LTC. 1999, pp. 39/42.
(2) E. Bouzon. O Código de Hamurabi, Petrópolis, Vozes. 1976, pp. 9/15.
(3) Fernando Báez. História Universal da Destruição dos Livros, tradução de Léo Schlafman, Rio de Janeiro, Ediouro, 2006, p. 31.
(4) Recomendação já acolhida, por exemplo, pela Austrália (1999), Estados Unidos (1999), China (2004), Colômbia (1999), Equador (2002), Emirados Árabes Unidos (2006), Eslovênia (2000), Filipinas (2000), França (2000) Índia (2000), Irlanda (2000), Jordânia (2001), Ilhas Maurício (2000), México (2000), Nova Zelândia (2002), Paquistão (2002), Panamá (2001), Coréia do Sul (1999), República Dominicana (2002), Singapura (1998), Sri Lanka (2006), África do Sul (2002), Tailândia (2002), Venezuela (2001) e Vietnã (2005).
(5) Guia Uncitral, § 16, disponível em www.uncitral.org.
(6) Sobre o tema, ver o excelente trabalho de Fabiano Menke: Assinatura Eletrônica no Direito Brasileiro, São Paulo, RT, 2005.
(7) (7) Conclui José Rogério Cruz e Tucci: “a eficácia probante dos contratos eletrônicos deve ser autorizada sem quaisquer óbices e subordinada à prudente análise do julgador, que poderá, por certo, quando se fizer necessário (art. 383, parágrafo único, CPC) recorrer aos demais meios de prova, em especial à prova pericial para certificar-se da autenticidade do respectivo documento) (“Eficácia probatória dos contratos celebrados pela Internet”, in Direito & Internet – Aspectos Jurídicos Relevantes, coordenação de Newton de Lucca e Adalberto Simão Filho, 2ª ed. São Paulo, Quartier Latin, 2005, p. 318).
(8) (8) Ver meu Curso de Direito Comercial, 12ª ed., São Paulo, Saraiva, 2008, vol. 1, pp. 468/471.

FÁBIO ULHOA COELHO
É Professor Titular de Direito Comercial da Pontifica Universidade Católica de São Paulo (puc-sp). Advogado.

Fonte: REVISTA DO ADVOGADO. 42
TÍTULOS DE CRÉDITO ELETRÔNICOS

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